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 BRASÍLIA – Parecer assinado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, diz que houve desvio de finalidade na decisão da presidente Dilma Rousseff de nomear seu antecessor, Luiz Inácio Lula da Silva, para chefiar a Casa Civil.
Para Janot, ao dar o cargo para Lula, Dilma quis retirar as investigações contra ele das mãos do juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Lava-Jato na primeira instância, e transferi-las para o Supremo Tribunal Federal (STF), o foro indicado para processar ministros de Estado. O procurador afirmou que a atuação da presidente foi “fortemente inusual” e serviu para “tumultuar” as investigações. Nesta quinta-feira, o ex-presidente prestou depoimento durante duas horas na Procuradoria Geral da República, em Brasília, para esclarecer detalhes das investigações da Operação Lava-Jato.
No documento, Janot afirma que o governo operou em várias frentes para tentar prejudicar as investigações contra Lula. “A nomeação e a posse do ex-presidente foram mais uma dessas iniciativas, praticadas com a intenção, sem prejuízo de outras potencialmente legítimas, de afetar a competência do juízo de primeiro grau e tumultuar o andamento das investigações criminais no caso Lava Jato”, escreveu o procurador.

Ainda segundo Janot, “o momento da nomeação, a inesperada antecipação da posse e a circunstância muito incomum de remessa de um termo de posse não havida à sua residência reforçam a percepção de desvio de finalidade”. O procurador ressaltou que o decreto de nomeação tem “aparência de legalidade”. No entanto, ele ponderou que “ato maculado por desvio de poder quase sempre ostenta aparência de legalidade, pois o desvio opera por dissimulação das reais intenções do agente que o pratica”.
O parecer de Janot foi enviado ao STF, para instruir ações do PSDB e do PPS que questionam a validade da nomeação de Lula. O ex-presidente tomou posse na Casa Civil no dia 17 de março. Depois disso, uma avalanche de ações questionando a legalidade do ato chegou ao STF e a varas de Justiça de todo o país. No dia 28 de março, o procurador enviou ao STF um parecer defendendo a legalidade da posse. No documento desta quinta-feira, Janot disse que mudou de ideia porque analisou melhor as provas do caso.
Para elaborar o parecer, o procurador levou em consideração as interceptações telefônicas de Lula divulgadas por Moro. Em especial, o diálogo em que Lula pede ao ministro Jaques Wagner, hoje chefe de gabinete de Dilma, que conversasse com a ministra Rosa Weber do STF, sobre um processo de seu interesse.
“Embora sejam corriqueiras audiências solicitadas por advogados com juízes para discutir processos judiciais e não haja ilicitude na realização dessas reuniões, a movimentação de aparato estatal, sobretudo autoridade do mais alto escalão, para defesa de interesses privados, põe em evidencia tentativa de intervenção do senhor Luiz Inácio Lula da Silva no funcionamento regular das instituições, valendo-se de importante aparato estatal, em temas afetos às investigações do caso Lava Jato”, observou Janot.
O procurador também considerou o depoimento do senador Delcídio Amaral na Lava-Jato. Segundo o parlamentar, o governo federal tentou interferir para prejudicar as investigações da Lava-Jato. “Seria incongruente e desconectado da realidade que nestes processos a Procuradoria-Geral da República fingisse desconhecer essas provas e, em avaliação meramente formal, opinasse pela denegação da ordem, pois isso equivaleria a afirmar a validade da nomeação”, argumentou.
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Janot também cita o diálogo em que a presidente Dilma diz a Lula que um mensageiro entregaria a ele o termo de posse, para ser usado “em caso de necessidade”. Para o procurador, Lula poderia até “emprestar reforço político em tratativas necessárias ao funcionamento da Presidência da República, dada sua experiência como ex-Presidente da República e sua qualidade de habilidoso negociador”. No entanto, nada justifica “as circunstâncias anormais da antecipação da posse”.
Para exemplificar “a sofreguidão do governo” para dar posse a Lula, Janot lembrou que foi necessário dar a Jaques Wagner, que era o ministro-chefe da Casa Civil, um status de ministro por meio de medida provisória, já que até então a chefia do gabinete da Presidência da República não tinha essa característica.
O ministro Gilmar Mendes, relator da ação sobre a validade da posse de Lula, pediu para o presidente do STF, ministro Ricardo Lewandowski, pautar o assunto para o julgamento em plenário. O colegiado poderá anular ou não a liminar do ministro, que suspendeu a posse por tempo indeterminado no mês passado. Ainda não há data prevista para o julgamento.

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