A indústria das dietas é uma das áreas da saúde mais rentáveis da atualidade. Anualmente somos bombardeados com diversas novas “dietas milagrosas” que prometem relevante perda de peso com mínimo esforço. De tempos em tempos, algumas dessas dietas conquistam celebridades, geralmente modelos ou atrizes famosas, e passam a ter grande visibilidade nos meios de comunicação.
A dieta Dukan, criada pelo médico francês Pierre Dukan, ganhou muita notoriedade nos últimos anos, depois que celebridades, como Jennifer Lopez, Giselle Bundchen, Penelope Cruz e Kate Middleton, tornaram público que eram adeptas da dieta.
Porém, da mesma forma que a fama rendeu milhões de dólares ao seu autor e tornou a dieta Dukan uma das mais famosas do mundo, houve também uma enxurrada de críticas de várias sociedades médicas e de nutrição, principalmente da British Dietetic Association, que desde 2010 contraindica o seu uso e classifica a dieta Dukan entre as 5 piores “dietas dos famosos”*.
O auge dos ataques ocorreu em Janeiro de 2014 quando a Ordem dos Médicos da França cassou a licença médica do Dr. Pierre Dukan sob a alegação de quebra do código de ética, devido à excessiva promoção comercial de produtos sem a devida comprovação científica.
* (http://www.nhs.uk/news/2011/11November/Pages/dukan-diet-celebrity-diets-unproven-dangerous.aspx)
A dieta Dukan não é cientificamente reconhecida porque os seus autores nunca tiveram interesse em submetê-la a estudos rigorosos, principalmente no que tange a parte dos efeitos colaterais e eficácia a longo prazo. Por outro lado, parece ser inegável que a dieta funciona a curto prazo, principalmente para aqueles pacientes que pretendem perder até 10 quilos. Porém, como não há grandes estudos científicos sobre a dieta, é impossível dizer exatamente qual é a sua taxa de sucesso. Há muita propaganda e poucas evidências científicas. Em saúde, isso não costuma ser um bom sinal.
Neste artigo vamos explicar o que é a dieta Dukan, quais são os seus resultados em relação à perda de peso e por que ela sofre tantas críticas das entidades de saúde.
O que é a dieta Dukan
A dieta Dukan, apesar de sua roupagem moderna, é, na verdade, uma releitura da também famosa dieta do Dr. Atkins, muito popular nas décadas de 1970 e 1980.
Assim como a dieta Atkins, a dieta Dukan é baseada em uma rigorosa restrição a alimentos ricos em carboidratos e um grande estímulo ao consumo de alimentos ricos em proteína animal. A diferença entre ambas dietas está no fato da dieta Dukan também ser muito restritiva em relação às gorduras.
Portanto, na dieta Dukan, o paciente pode comer grandes quantidades de proteína animal ou vegetal e quase nenhuma quantidade de carboidratos e gordura.
A dieta do Dr. Pierre Dukan é dividida em 4 fases:
1ª fase da dieta Dukan: fase de ataque
Essa fase é bem simples. O paciente só pode comer carnes magras, a quantidade que quiser ao longo do dia. O autor fornece uma lista de 72 fontes de proteínas, incluindo carne de vaca, peixes, aves sem pele, ovos, leite desnatado, queijos magros, tofu, seitam e soja. Apenas carne de porco, cordeiro, pato e ganso não são permitidas.
Fora o consumo de proteínas, nesta primeira fase, só é indicado o consumo de 1 colher e meia de farelo de aveia e cerca de um litro e meio de água por dia.
Essa fase dura até 10 dias, e o objetivo é perder pelo menos 2 a 5 quilos.
2ª fase da dieta Dukan: fase de cruzeiro
Na fase de cruzeiro o paciente pode comer os mesmos alimentos da fase 1, mais alguns vegetais pobres em carboidratos em dias alternados. Portanto, em um dia você come só proteína e no outro você come proteína e algum vegetal sem carboidrato.
Exemplos de vegetais permitidos: alface, agrião, rúcula, escarola, tomate, berinjela, pimentão, azeitona, abóbora, cogumelo, pepino e aipo.
Essa fase dura o tempo que for necessário para o paciente atingir o peso desejado. A velocidade de perda de peso nesta fase é de 1 a 2 quilos por semana.
3ª fase da dieta Dukan: fase de consolidação
Uma vez que o paciente tenha atingido o peso desejado, ele pode passar para a terceira fase da dieta. A fase de consolidação dura 10 dias para quilo de peso perdido. Portanto, se o paciente até aqui perdeu 10 quilos, ele deverá permanecer na fase 3 por 100 dias; se perdeu 15 quilos, a fase 3 durará 150 dias, e assim por diante.
Nesta fase o paciente pode comer proteínas (inclusive as proibidas nas 2 primeiras fases) e vegetais sem carboidratos à vontade, sem precisar alternar dias. A partir de agora, a dieta permite a introdução gradual de frutas, pão, massas e queijos gordurosos. 1 a 2 vezes por semana o paciente pode fugir da dieta, comendo aquilo que desejar.
4ª fase da dieta Dukan: fase de estabilização
A partir desta fase o paciente fica liberado para comer o que bem entender, contando que siga as seguintes 3 regras:
– 1 dia por semana ele deve comer somente proteínas como fazia na fase 1.
– Comer 3 colheres de sopa de farelo por dia.
– Caminhada de 20 minutos por dia.
A dieta Dukan funciona?
Sim, os pacientes realmente emagrecem com essa dieta, principalmente quando pensamos apenas no curto prazo.
Qualquer dieta para ser efetiva precisa fazer com que o paciente ingira menos calorias do que ela gasta no seu dia a dia. Emagrecer ou engordar é uma simples conta aritmética. Se o paciente gasta 2000 calorias por dia e ingere apenas 1500, ele irá emagrecer. Se o paciente gasta 2000 calorias pro dia e ingere 2500, ele irá engordar. É simples assim.
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Como a dieta Dukan restringe muito o consumo de calorias, ela realmente causa relevante perda de peso nas suas fases iniciais. Em média o consumo calórico diário nas 3 primeiras fases da dieta Dukan fica ao redor de 1000 calorias por dia, o que é suficiente para uma perda de 0,5 a 1 kg por semana na maioria das pessoas.
Portanto, as principais críticas à dieta não são em relação a sua efetividade a curto prazo, mas sim à ausência de estudos científicos, principalmente quanto à sua segurança e eficácia a longo prazo.
Críticas à dieta Dukan
A dieta Dukan não ensina o paciente a comer melhor, não muda os seus hábitos alimentares e não dá ênfase à atividade física para que o paciente perca calorias fazendo exercícios e melhorando o seu condicionamento cardiorrespiratório. O programa até sugere caminhadas diárias, mas o foco principal é mesmo a restrição de carboidratos e gorduras. Isso significa que sua efetividade a longo prazo não é das melhores.
Outro grave problema da dieta é que nas fases iniciais há restrição completa de alguns grupos alimentares. Não é recomendado subtrair de forma radical carboidratos e gorduras da dieta. Isso implica em impedir o paciente de consumir nutrientes importantes para a sua saúde.
A quantidade de proteínas ingerida pelo paciente, que se dá de forma praticamente exclusiva nas primeiras semanas de dieta, também é alvo de preocupação. Proteínas são importantes, mas não devem ser a única fonte de alimento. Aliás, nenhuma fonte de alimento isoladamente é recomendada. O que torna uma dieta saudável é exatamente o equilíbrio entre as diversas fontes de nutrientes.
Um estudo realizado na Polônia em 2015 com 51 mulheres entre 19 e 64 anos mostrou que durante as 3 primeiras fases da dieta Dukan, que podem durar vários meses, a dieta dos pacientes estava totalmente desequilibrada, com ingestão acima do recomendado de nutrientes como proteínas, fósforo, vitamina A e sódio, e abaixo do recomendado para carboidratos, vitamina C, ferro, potássio e ácido fólico.
A principal fonte de energia para as nossas células é a glicose e sua principal origem são os carboidratos. Quando o paciente assume uma dieta sem carboidratos, o organismo precisa lançar mãos de alguns mecanismos para obter a energia que tanto necessita. O modo mais simples é através da queima dos estoques de gordura, fazendo com que o organismo produza corpos cetônicos, substâncias ácidas originadas da quebra da gordura em ácido graxo, que são utilizados como fonte energética alternativa à glicose.
A dieta Dukan é, portanto, uma dieta cetogênica, e boa parte dos seus efeitos colaterais vêm deste estado de cetose.
Efeitos colaterais da dieta Dukan
Dietas cetogênicas são velhas conhecidas da medicina, pois nas primeiras décadas do século XX eram a única forma de tratamento de pacientes com epilepsia. A própria dieta do Dr. Atkins já foi estudada como alternativa para controlar epilepsia em crianças.
É graças à cetose que o paciente consegue perder peso rapidamente nas primeiras semanas. Mas ao contrário do que o paciente imagina, relevante parte desse peso perdido não é gordura, mas sim água. A acidose gerada pelos corpos cetônicos faz com que o rim tenha de trabalhar mais para impedir que o sangue torne-se muito ácido. Isso significa eliminar na urina grandes quantidade de ácido, que costumam ir junto de sódio e água. Portanto, o paciente desidrata nos primeiros dias de dieta. Por isso, indica-se o consumo de pelo menos 1,5 litro de água por dia nas fases iniciais.
Efeitos colaterais comuns da dieta Dukan provocados tanto pela desidratação quanto pela cetose são náuseas, mal-estar, mau hálito (conhecido como hálito cetônico), boca seca, dor de cabeça e fraqueza. A falta de fibras colabora para prisão de ventre, motivo pelo qual é recomendada a ingestão de farelo de aveia.
– CÁLCULO RENAL | PEDRA NOS RINS
– ÁCIDO ÚRICO E GOTA
– COLESTEROL HDL, LDL E TRIGLICERÍDEOS
– OSTEOPOROSE
O consumo excessivo e quase que exclusivo de proteínas aumenta o risco de doenças renais, principalmente a formação de pedras nos rins. Lesão renal aguda pelo excesso de proteínas também é uma preocupação nos pacientes que já possam ter alguma lesão renal prévia (muitas vezes desconhecida pelo paciente). Aumento nos níveis de ácido úrico e maior risco de desenvolvimento de gota também são efeitos colateiras possíveis das dietas cetogênicas. Elevação do nível de colesterol e redução da massa óssea são outros problemas potenciais desta dieta.
Dietas com grandes restrições de carboidratos e consumo excessivo de proteínas também já foram relatadas como causa de cetoacidose, um efeito colateral potencialmente grave provocado pelo aumento da produção de ácidos no sangue.
Durante as diversas fases da dieta, o paciente pode apresentar o famoso efeito sanfona, que é a perda e o ganho de peso de forma cíclica. Hoje em dia sabemos que essa é a pior forma de emagrecer, pois é a que está mais associada a riscos cardiovasculares. É menos perigoso não emagrecer nada do que alternar de forma rápida ganhos e perdas de massa gorda.
Além disso, nos últimos anos, as evidências de que exista uma relação entre o alto consumo de carnes vermelhes e a incidência de alguns tipos de cânceres têm se tornado cada vez mais fortes. Muitas pessoas que aderem à dieta Dukan acabam aumentando muito o seu consumo de carne vermelha, apesar desta não ser a única opção de carnes da dieta (leia: CARNE VERMELHA REALMENTE CAUSA CÂNCER?).
Veredito sobre a dieta Dukan
Por tudo o que foi explicado neste artigo, diversas sociedades médicas e de nutrição não consideram a dieta Dukan uma opção aceitável para perder peso. O efeito a longo prazo é pobre, o paciente pode variar muito de peso ao longo da dieta (efeito sanfona), há graves restrições nutricionais e os efeitos colaterais podem ser graves.
Um estudo feito na França com 5000 pessoas que se submeteram à dieta mostrou que cerca de metade delas já havia engordado tudo de novo em menos de 1 ano; e após 4 anos, quase 90% das pessoas tinham o mesmo ou até mais peso que antes da dieta, o que mostra que a dieta Dukan, além de não ser saudável, não ajuda o paciente a perder peso de forma persistente.
O dieta Dukan já existe há vários anos, rende muito dinheiro e tem centenas de milhares de adeptos, muitos deles com boa resposta em relação à perda de peso a curto prazo. Não há motivos, portanto, para que os seus apologistas ainda não tenham realizado um grande estudo científico sobre a mesma. Basta um grande estudo, com boa metologia científica e seguimento dos pacientes por alguns anos, para que a comunidade científica passe a ver a dieta Dukan com menos restrições. Enquanto isso não ocorrer, infelizmente, não é possível indicar esse tipo de dieta para a população.
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